segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Quanto tempo se passa olhando para o espelho?

Eu tinha em torno de 11 anos quando eu vi o teto da minha casa desabar.

O forro estava condenado por cupins, e eu nunca esqueci daquela cena.


Pouco antes dele vir ao chão, eu corri para salvar minha gata.

Por muito pouco, um bloco de concreto não caiu em cima de nós dois.


Eu nunca esqueci daquela cena e nem

da sensação

de sentir o teto desabar.

 

Depois tivemos que desocupar a casa,

para que pudesse ser feito as reformas.

 

Já se passaram muitos anos e o teto nunca mais caiu,

não o de concreto,

mas o teto emocional

está se esvaindo.


Antes eu tinha uma gata para salvar

e agora

tenho muito pouco o que salvar.


A gata morreu de velhice há anos,

nos braços de minha mãe. 

era uma quarta-feira e estava tendo o jogo do São Paulo.


parei de assistir,

para cavar um buraco

em nosso jardim, no meio da noite;

e enterrar ali,

mais uma porção de memórias da vida, enrolando em pedaço de pano.


Deve ser para os buracos na terra que vão todas as nossas lembranças.


Se é assim que vai ser, que sentido faz? Que diferença nos faz?

Eu já enterrei uma porção de memórias boas em diversos buracos que cavei em minha vida.

E agora

só falta quebrar e enterrar o meu espelho. 

terça-feira, 2 de novembro de 2021

96 semanas

São 96 semanas e um pedaço de vida
tempo e espaço centralizado sem saber que tudo
estava prestes a desabar.

96 semanas de um grito de socorro.
Como eu poderia saber,
que tudo iria acabar?

O sol brilhava e eu via água limpa
que banhava minha alma

eu olhava tudo e
em silêncio apreciava
respeitava
e agradecia

Pessoas desconhecidas e diferentes sorrisos,
me deixavam singelamente sem graça
mas me faziam bem e eu os bajulava

tentando dar um pouco de mim
em agradecimento por tudo que davam a mim.

um jovem como eu,
em processo finalizado de recomposição,
pronto para enfrentar o mundo
com o pensamento de que tudo iria dar certo dessa vez.

mas como iria saber?

foram 96 semanas de um peso escuro
e não teve um dia
que eu não senti a corrosão

o cheiro do óleo
e o barulho ensurdecedor.

uma vida a desmoronar
a perder-se no sentido
a perder-se de suas esperanças.

desarmado e sem alma.

onde está agora o menino de 96 semanas atrás?
Grite na beira desse lindo oceano
e eu garanto que ninguém vai te ouvir.

96 semanas e eu tive sorte
por ao menos ter guardado essa foto
que tirei ao final do que foi o meu último dia feliz.







domingo, 2 de maio de 2021

Ruínas de um lugar qualquer


Estou me pedaços, nunca estive tão em pedaços
Nunca pensei que ficaria amarguradamente em pedaços.
Às vezes me pego fazendo contas
Para saber se errei tanto assim.

Não sou só eu que sofro
Sinto o sofrimento ao meu redor
Agora escuto o vento na janela bater todas as tardes
E estranhamente, parece que escuto
A voz de tudo que vai morrer.

Oh, vejo amigos tristes, familiares tristes, vizinhos tristes.
Chegou o fim do mundo?
Chegou o tempo em que literalmente a felicidade é algo distante do passado
E que nada mais dá certo
E em tudo que tentei, eu fracassei. 
Eu fracasso constantemente até mesmo nas minhas tentativas de sorrir.

E eu não acho que sai como vencedor das batalhas que travei
Pelo contrário
Eu nunca quis ganhar nada e nem vencer de alguém. 

Pensei que poderia levar a vida como uma leve onda que bate na praia
numa tarde ensolarada
de primavera.
E que tudo ficaria bem no final,
Mas não ficou
e agora não vai mais ficar.

Minha mente todo dia me castiga, com um bilhão de pensamentos do passado.
A dor de envelhecer
É que quanto mais você fica velho
Mais coisas tem para lembrar.

Talvez o Alzheimer apareça na terceira idade
Exatamente para poupar as pessoas da dor da memória
E de ver uma vida que passou
E que agora
Só resta terminar...

Como deve ser difícil
E como é difícil para nós ocidentais, lidarmos com a vida

Eu queria viver eternamente
Naqueles dias
Em que tudo era sorriso
Em que tudo era música
Em que tudo era amor e minha
única preocupação, era não chegar atrasado para viver. 

Imagem/art: Andrei Tarkovsky

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Katyusha

 Ei destino, o que tem reservado?

como pode incomodar tanto minha paz

sem me trazer ventos bons?


Dias e dias se passam e la se vão meus anos

de uma mesmice sem tamanho,

onde não existe um dia sequer 

que não lembre do passado,

em uma época florida,

de outrora repousava minha alma

no deleite daquele presente já tão distante.


ora destino,

o que eu te fiz?


Eu sei que em determinado momento

não fui uma boa pessoa

e sei,

que em determinadas ruas,

meus passos não voltaram mais ecoar.

Eu sei que em alguns sonhos, eu

não voltarei a participar.


mas ora destino 

como ousa fechar meu sorriso?


eu me esforcei

tanto transtorno enfrentei

e pensei que enfim

chegaria num lugar melhor.


e agora


uma canção folclórica toca

descubro algo novo

algo que gostaria de contar


e eu tenho tenta coisa acumulada pra contar

eu posso contar sobre as coisas mais tristes e belas do mundo inteiro

mas ninguém desse mundo inteiro, quer mais me ouvir. 


Então o silêncio toma conta de meus dias

apagando todas as luzes de minha sabedoria. 




domingo, 16 de agosto de 2020

O estacionário

Durante muitos anos este foi um recanto meu,
onde alinhava alguns pensamentos
e tentava deixar algo registrado com a marca dos meus anos.
Fato é que eu não sei escrever bem como gostaria
mas acho que no fim, 
eu fiz um bom trabalho.
Eu trabalho que eu não me sinto bem e nem tenho coragem de rever.
 
dói só de começar.
 
Há muito silêncio aqui agora e quando eu puxo minha cadeira
já não me sinto a vontade.
Minhas costas doem
pois sinto o mundo que construí sobre os erros que acumulei.
 
Agora eu não tenho mais plateia
e eu nunca precisei mais do que um único aplauso.
 
Talvez eu tenha escrito algumas frases que não foram muito bonitas
e se machuquei
peço desculpas.
Eu só estava tentando viver, de uma forma diferente.
 
agora eu só vivo de saudades
tenho saudades do mar
do vento na cara
do silêncio
da música que massageia a alma
da vida sendo bem vivida
saudades de mim
com um bom sorriso no rosto,
antes de tudo isso começar.


domingo, 19 de julho de 2020

Uma música antiga


Ponteiros do relógio girando
o tempo passando rápido novamente
o ano já está indo embora
e dessa vez eu sei que nem vivi.
Numa música antiga que toca no rádio
diz que o passado é uma velha roupa colorida que não serve mais,
mas a roupa do presente também não serve e então me desespero.

Bom mesmo
era quando eu sabia que nos domingos pela noite,
iriamos ficar conversando e mesmo a distância,
estaríamos sempre muito perto.
era como se eu pudesse sentir sua respiração.
e era sempre incrível
como tínhamos dificuldades de dizer boa noite
e se despedir...
Os ponteiros no relógio também giravam
mas eu não me importava com eles.

Agora eu não tenho quem leia estes poemas
E eu já não encontro olhos em outras pessoas
que me inspiram a escrever.

Eu descobri que ninguém brilha como você
E eu também sinto que cada vez mais
significo menos para as pessoas
rumando assim
a abstinência de mim mesmo,
naquele passado onde a roupa já não me serve mais.

sábado, 7 de março de 2020

O máximo descaso sobre o esforço de um soldado que já luta sem armas.

A gente espera o dia inteiro
a gente espera a semana inteira
por uma iniciativa
por um telefone tocando
por um campainha ou alguém batendo em sua porta
pedindo para entrar.

você sabe que fez o melhor que pode
mas sabe que poderia ter feito
muito mais
se tivesse interesse
se tivesse tempo
com calma
com jeito.

mas não deu
a vida as vezes da uma chance
e se você não está preparado para corresponder a altura
você perde
logo
não há como voltar atrás
e
ninguém liga mais.