terça-feira, 27 de novembro de 2018

O Último Dia de Verão

Eu me lembro daquelas noites onde eu podia
simplesmente gritar por seu nome
e de onde estivesse
você apareceria pra mim.
mas isso
não
funciona mais.

Eu sou apenas o que restou de uma das vidas que habitava em mim.
Vida da qual em um determinado momento que não percebi ao certo
trocou de lugar com a outra que tomava conta de mim
se apossando de meu corpo, 
de minha vida e de meus atos. 

e eu não sei se amo essa personalidade que sou, ou que era, ou que um dia ainda serei
mas sei que por enquanto, 
eu estou deixando a vida em ponto morto
e tudo está tão difícil
em todas as curvas, em todos os cantos, em todos os lugares
existe dificuldades me impedindo de seguir e as pedras, não param de cair.

Mas mesmo assim sei que não adianta mais gritar seu nome.

pois eu já fiz isso algumas vezes, em determinadas noites
quando passo geleia no pão e bebo com uma taça de vinho barato
sentindo o cheiro de incenso no ar.
mas você 
nunca mais
me ouviu. 

e nunca apareceu.
além do mais
acho que me tornei um desconhecido na multidão
e que eu
por convicção 
acredito que passaria desapercebido por você
pelo seu olhar e pela sua vida,
mesmo se um dia por acaso
cruzássemos pelo mesmo caminho
e se alimentássemos juntos,
os mesmos pombos da praça da sé. 
ainda sim, você não me veria mais ali. 

No final,
o seu caminho foi realmente o certo,
pois eu sou um sonho pequeno demais
para os teus anseios
e você foi atrás de algo maior
que realmente eu não teria condições de fornecer.
e eu fico aqui, 
saboreando pão com geleia 
tentando entender onde exatamente eu perdi a linha do meu destino...

e logo mais
será noite de lua cheia, e estamos no verão
onde tudo é mais bonito
e eu não vou poder compara sua beleza com a da lua dessa vez.
...
já se foi 
tanto tempo.
e mesmo assim
eu ainda vejo o brilho do seu olhar toda vez que olho pra ela. 


Mas mesmo assim
sei que
não adianta mais
gritar
seu nome.




terça-feira, 13 de novembro de 2018

Você vira a esquina mais uma vez... de volta para casa.

A vida que estaciona
aquela música que embalava o  gingado, não vai mais tocar.
todos ao seu redor parecem felizes.
e você fica feliz por eles
mas é singelo consigo mesmo, espera em silêncio o dia que vai sorrir solto
ao invés
de fingir
todas as vezes
que eles estão por perto.
fingimos pois não podemos dar ao luxo de nos confessar
e perder o tempo da vida dos outros.

e eu sempre fui mais de ouvir o que tem para dizer
do que dizer o que eu tenho que falar.

e foi moldando esse jeito meio antiquado que fui chegando até aqui.
e as vezes
isso rasga o meu peito
e as vezes, esse mundo que desejo
foge do meu jeito
eu beiro a loucura,
e então tudo parece que congelar
parando de fazer sentido

a rotina
o conhecimento
as inspirações
o amor
e a saudade


os pontos fortes dos laços da vida humano
desabrocham
e tudo desmorona;
mas a gente fica calado sentado no escuro
como fomos ensinados pelos nossos pais
sempre com um sorriso no rosto para as pessoas estranhas,
escondendo por trás a nossa
tenebrosa insatisfação.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Desafia o nosso peito a própria morte.

Deitado embaixo de uma árvore, 
foco meu olhar em uma folha sobre o fundo azul 
o vento sopra, ela se meche, mas em segundos volta ao lugar.
tudo parecia bem, tudo parecia leve.
embaixo
formigas trabalhavam incansavelmente
para suprir os desastres causados pelo último inverno em seus formigueiros.
tudo parecia calmo.
mas era o começo de mais uma primavera em nossas vidas
não havia muito o que comemorar para dizer a verdade
com exceção das formigas é claro.
eu começo a ouvir tiros no fim da tarde;
eram fogos de artifício
mas não era final de campeonato
nem festa de são joão.

era uma comemoração
do medo
elegeram um fascista nas urnas. dessa vez
eles foram mais longe do que eu pensava.
vestiram as camisas
estas que já não eram verde e amarela
mas sim, do rosto
de seu líder, do rosto
de alguém que repugna gays
mulheres
negros
pobres
trabalhadores.
 
ele nos odeia.
e ouço mais fogos
em comemoração
e vejo
gente que ele odeia
gritando sob euforia que esse 'mito venceu'
e esse mito
que vai nos matar,

ele
nos
odeia
e ele
venceu

resistiremos.
basta lembrarmos das formigas que nos dão exemplos sem parar.
de como reconstruir suas vidas depois de um longo e frio inverno
e que aprendemos com elas agora
os segredos dessa humanidade
a força do coletivo
o caminho da união, o roteiro da luta
nem que seja
a nossa última vez.