quarta-feira, 20 de maio de 2015

Um copo meio vazio

Eu estava lá, em um canto escuro, apreciando uma boa dose de uísque e observando a arquitetura daquele lugar. Tinha bandeiras de todos os países, generais por todos os cantos, o ar bélico em formato de bar impressionava. Enquanto observava o recinto tentava automaticamente achar uma válvula de escape para mim, ou uma resposta para todas as minhas perguntas, até mesmo para aquelas que ainda não fiz. Ao redor tinha muita gente, era um sábado, as pessoas normalmente saem de suas tocas e do aconchego de sua rotina para se divertirem. Mesmo assim sentia que aquele lugar estava solitário. Às vezes a maioria não representa nada e naquele momento era literalmente o caso.

Na mesa ao lado havia um casal, estava nítido que aquele era o primeiro encontro. Um homem com boa aparência contemplava uma mulher que tinha um rostos lindo e um sorriso esplêndido que iluminava aquele lugar escuro e sombrio. Perto dali estava eu, um zero ao meio e sem significância alguma para qualquer vida naquele lugar. Não delongou muito, depois de algumas bebericadas os dois foram se aproximando, logo carícias e um tom romântico resplandeceu nas dependências daquele lugar. Beijos lentos, discretos e molhados começaram a surgir no mais absoluto alvoroço das pessoas ao redor. Era bonito de se ver. Acho que foi a primeira vez que senti inveja. Não era exatamente por não estar no lugar dele, mas era por eu estar em silêncio, junto a mim mesmo, isso era devastador e as paredes sabiam disso e tentavam me fazer companhia.

Apesar de sinuosa visão eu também não estava tão só assim, tinha mais um monte de derrotados bebendo ao meu lado, todos com feições sorumbáticas em seus rotos e alguns até mesmo estavam lustrando bombas e ninguém ali se importava com isso. Eles esperavam desesperadamente para que entrasse uma mulher por aquela porta e salvasse de uma vez por todas vossas malditas noites angustiadas, para quem sabe, depois de alguns dias, fossem lançados de volta ao mesmo abismo em que se encontravam, ao mesmo bar, a mesma bebida e a mesma sensação de derrota complacente de um indivíduo solitário.

Depois de alguns instantes de ouço vozes alteradas atrás de mim, era outro casal, estavam discutindo. Não entendi muito bem, mas notei que tinha algo haver com dinheiro. As ofensas aumentavam e chamavam atenção de todos os presentes. Creio que somente eu percebi que era o oposto do casal ao meu lado, que parecia nem ligar para o palavreado inoportuno da mesa ao lado, continuavam agarrados, conversando baixinho e com olhos cintilantes um para o outro, como se estivessem completamente sozinhos. Ali existia um começo e atrás de mim um fim. Essa é uma vida ordinária. Dessa vez ao menos eu não fazia papel de protagonista ou vilão e ficava feliz por isso, ali eu era um mero telespectador com o copo meio vazio que observava a continuidade natural das coisas, mas sem conseguir ajudar ninguém, muito menos salvar eu mesmo do delírio que sentia.






Pagou a conta e cambaleou até o carro com o copo em mãos, foi vagarosamente dirigindo até sua casa. Encontrou sua cama, se jogou e depois de muito tempo pegou no sono e adormeceu. Depois de muitas tentativas e noites se dormir a derrota da noite anterior lhe trouxe a paz, pois finalmente percebeu que já não tinha mais nada que pudesse fazer.

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